Dec 28, 2008

Alguns conseguem...celebrar

Típica família americana comemorando o Natal

Segundo o dicionário, celebrar significa exaltar, louvar ruidosamente, cumprir solenemente um ritual religioso. Dissecando um pouco mais essa palavra, e mais ainda, o conceito, chegamos a um impasse: Quem comanda uma data comemorativa? O cérebro, uma divindade?Quem está por trás disso?Bom, não sei se teremos uma resposta, mas o importante é questionar.

Não me esperem ouvir falar mal do Natal e das festas de final de ano ou de qualquer outra. Elas têm a sua função. No caso do Natal, aproxima as famílias distantes, deixa as cidades mais bonitas - coisa necessária em algumas metrópoles brasileiras - Além de aquecer a economia. No entanto, se o mundo fosse só isso, estaríamos felizes, como vacas de presépio.

O mundo ocidental segue uma lógica invisível, uma orquestração para que tudo se mantenha sob controle. Controle social. E isso é mais forte do que a Igreja Católica (eventual culpada por tais eventos) e muito mais forte do que a própria cristandade. Antropólogos poderiam explicar melhor, mas não só eles, economistas, filósofos, cientistas etc. A força das celebrações de massa – especialmente o Natal, a maior delas – é algo alquímico, algo que ultrapassa os limites do nosso entendimento. Um processo que vem se desenrolando há séculos e que pra onde ninguém sabe. Alem do bem ou do mal, é bom termos apenas consciência do que isso significa, mesmo que pra isso montemos o nosso núcleo particular de resistência – não apenas aos eventos, mas à mediocridade vestida de paz.

Dec 7, 2008

Alguns conseguem...admirar

Louis Garrel, ator francês sensação....Alguém para se admirar até quando?

Há uma certa inocência na admiração. Penso nos meus heróis da infância e juventude e percebo uma certa fragilidade no critério que me fez valorizar algo neles. Sendo anacrônico, nenhum deles era o que eu pensava que fosse. Nem tão inteligentes, nem tão interessantes, nem muito menos talentosos, estavam apenas no lugar certo para a pessoa errada, eu . Excluindo-se pais, professores, tios e personagens da TV, que são adorados in natura, dificilmente continuamos a admirar algo ou alguém por muito tempo ao longo de nossa vida.

Seja por desgaste natural dos nossos objetivos - ídolos são meras materializações de objetivos - seja mesmo por cansaço e decepção. Querer acreditar que alguém nos supera é algo meio que necessário para que consigamos lhe superar. Quando esta permanece por muito tempo sem superação, algo de estranho está no ar. Nada contra.

É interessante que os nossos astros “amadureçam” junto com a nossa experiência humana. Não há nenhum problema em ler Paulo Coelho, se daqui a dez anos você chegará em Kafka. O importante é não parar, é não fazer dos ídolos muletas para alguma deficiência que ninguém consegue enxergar em você, só olhando o objeto que se venera.

Nov 22, 2008

Alguns conseguem...ser aceitos

À esquerda, Sean Connery em 007 Casino Royale , à direita, Daniel Craig, o novo 007. Dois exemplos de carismas diferentes dentro do mesmo personagem.

Vivo pensando o que faz uma pessoa aceita ou não no seu micro cosmo. Conheço exemplos diversos de sucesso profissional ou emocional. No entanto, consigo distinguir claramente quem venceu pelo lado técnico ou quem venceu “com a cara”.

Deixe-me explicar melhor. Quem não se lembra daquele nerd que sentava lá na frente na sala de aula? Sim, ele venceu. Hoje está com um bom emprego, concursado, feliz. Mas ele venceu como um bom técnico, como alguém que impõe seu conhecimento e está aí da maneira mais burocrática possível.

Do outro lado, temos o bad boy, o persuasivo, aquele que apenas sorri e todos o acompanham. Temos vários exemplos na literatura e no cinema.

Não sei qual muito bem qual é a seleção natural (caráter, personalidade, cultura) ou material (berço de ouro) que fazem as coisas serem assim, ou seja, as portas que se abrem ou se fecham para joão ou josé. Só concluo que as coisas se tornam mais fáceis quando encontramos do outro lado uma mão estendida e um sorriso aberto, um café quente ou roupa de cama lavada, alguém para nos ajudar, mesmo sem saber qual preço será cobrado depois.

Nov 9, 2008

Alguns conseguem...ser Dylan Thomas

O jovem Dylan Thomas

Bêbado ou desesperadamente embriagado é a imagem mais comum que fazemos de Dylan Thomas, poeta galês nascido em 1914 e morto em 1953 em NY. Seus poemas são incrívelmente tristes e desconsolados. Talvez por causa da vida que tenha levado desde cedo. Abandonou a escola, tornou-se jornalista e casou-se aos 22 anos com uma irlandesa que teria que sustentar pelo resto da vida junto com 3 filhos que teve.

Nada do que Thomas fez ao longo de sua vida pareceu dar certo. Vendia roteiros sub-valorizados para a BBC, que depois de certo ponto o rejeitou; era facilmente demitido dos empregos que arranjava. Morando em Londres, tentou ficar próximo dos amigos burgueses até quanto pôde, até que foi perdendo todos os hábitos que o ligava a esta classe , exceto um, a bebida. Um dia, em viagem a Nova York, chegou ao cúmulo de 35 doses de Whisky numa só noite, causando uma hemorragia cerebral, fazendo o morrer de eczema alguns dias depois aos 53 anos de idade.
Sua poesia não tem muito mistério, é só desilusão e saudade. Um trecho a seguir:

Rompe a manhã, senil
Semeada de escombros.

Perde-se o meio dia entre nimbos
Escura
Perde a tarde
Sabendo a cinza e sepultura.


O poeta carrega a noite sobre os ombros.


Oct 18, 2008

Alguns conseguem...ser americanos

Foto de mãe imigrante durante a grande depressão americana de 1929, foto de Dorothéa Lange

Estive nos EUA nas últimas semanas e algo que sempre me vem muito à cabeça é sobre o porquê dos EUA serem quem são. Pondo de lado as discussões econômicas, que ao meu ver, só deixam a conversa tendenciosa e também os assuntos políticos, que nos levam a ser maniqueístas com eles (sempre serão vilões), gostaria de abordar o ponto de vista humano, pra não dizer antropológico.

O que me encanta nessa nação é o impulso criativo que une a todos, o que me espanta é como tudo é duramente padronizado. Um bom e um ruim. Talvez os EUA seja o lugar perfeito para se ter uma grande idéia e ficar rico, talvez seja o lugar perfeito para ser negro e ser discriminado; não importa. Para o bem ou para o mal, é um lugar para se ser, para se acontecer. Para se experimentar, se jogar. Não existe tanto o ranço histórico que paralisa os europeus, nem a corrupção hemorrágica latina, herdada pelos seus bárbaros colonizadores. Isso deixa a coisa mais fácil para uma experiência humana.

Pode parecer clichê esse post, mas só queria mais uma vez trazer esse fato à tona, já que os EUA estão nas manchetes por causa da crise financeira e estarão nas próximas semanas por causa das eleições. Pode ser justo dizer que eles causaram a crise; é louvável que um negro poderá chegar à presidência. Um fato ruim e outro bom, respectivamente. Em um exemplo, a tendência é rejeitar o modelo, no outro, temos a aprender.

De um jeito ou de outro, seria bom deixarmos de ser hipócrita e reconhecer: temos que começar a aceitar o nosso status quo de young americans.

Sep 21, 2008

Alguns conseguem...casar

William Bonner e Fátima Bernardes, da TV Globo. Um telecasal.

Tenho pensado no papel do casamento em nossas vidas e cada vez mais chego a conclusão que o pro indivíduo se casar com alguém é como o voto, uma opção política. Historicamente, os grandes casais foram aqueles que dividiram muito mais do que a cama ou a escova de dente. Romeu e Julieta dividiram o ódio de suas famílias; Diana e Charles, a realeza e a atenção dos paparazzi; Lampião e Maria Bonita, o cangaço; Cleópatra e Júlio Cesar, o Império Romano; Jesus e Maria, o amor de Deus; Juan Domingo e Evita Perón, a Argentina (e seus lucros); FHC e Ruth Cardoso, a Sociologia; Batman e Robin, Gothan City. Bom, poderíamos ultrapassar a cota falando de outros tantos casais, mas o fato a ser chamado atenção é que todos esses se unem por uma causa e mesmo tendo se separado ou não em algum momento, continuaram a ser vistos como casais. Desconfio que esse argumento nos mostre que a grande natureza do casamento sejam as causas e não as pessoas, daí a sua durabilidade. No fim, as relações estáveis são como uma grande amizade, em que o amor e o sexo às vezes trazem a combustão, mas sozinhos não são suficientes para levantar uma labareda.

Aug 25, 2008

Alguns conseguem...ter esperança

Dizem os especialistas que a Caixa de Pandora na verdade é um vaso. Virou caixa graças a um erro histórico de tradução.
Ilustração: Alessandra Cavalcanti (Alê): tresbonecas.blogspot.com

No dia em que se completa 108 anos da morte de Friedrich Nietzsche, publico algo sobre um assunto que estava na minha cabeça há um certo tempo. Na verdade, nunca tive a coragem de escrever, acrescentando-se o fato de que qualquer coisa que escrevesse seria minúsculo diante do texto abaixo.

"Pandora trouxe o vaso que continha os males e o abriu. Era o presente dos deuses aos homens, exteriormente um presente belo e sedutor, denominado 'vaso da felicidade'. E todos os males, seres vivos alados, escaparam voando: desde então vagueiam e prejudicam os homens dia e noite. Um único mal ainda não saíra do recipiente; então, seguindo vontade de Zeus, Pandora repôs a tampa, e ele permaneceu dentro. O homem tem agora para sempre o vaso da felicidade, e pensa maravilhas do tesouro que nele possui; este se acha à sua disposição: ele o abre quando quer; pois não sabe que Pandora lhe trouxe o recipiente dos males, e para ele o mal que restou é o maior dos bens – é a esperança. – Zeus quis que os homens por mais torturados que fossem pelos outros males, não rejeitassem a vida, mas continuassem a se deixar torturar. Para isso lhes deu a esperança: ela é na verdade o pior dos males, pois prolonga o suplício dos homens."

Friedrich Nietzsche, In: Humano, Demasiado Humano.

Aug 10, 2008

Alguns conseguem...Ser pai

Pai e Filho (2003), Filme de Alexander Sokurov

Pensar a paternidade é sempre entrar num universo cercado pela polêmica, primeiro porque não há nem uma evidência aparente sobre ela, a não ser a semelhança física; segundo porque hoje, num universo de milhões de mães solteiras no Brasil, fora outros tantos mundo a fora, acaba se tornando uma figura meramente alegórica, sem utilidade. Desde os tempos antigos, o pai costuma ser ligado à força, à energia vital, ao enquadramento do indivíduo na sociedade. Pai é aquele que estimula o vencimento de barreiras, o que instrui para a competição e o que também repassa todas as vísceras culturais daquela sociedade, i.e., os palavrões, “a coçada”. Esteticamente falando, temos várias referências culturais sobre os pais, desde Fábio Jr. e seu clássico dos anos 80 até o próprio papa, depois que sua figura virou pop. Ao longo da história, o pai foi o senhor das Casas Grandes, na sociedade patriarcal, na definição romântica de família, era consultado quando o rapaz ia arduamente pedir a mão da mocinha.

A degradação do pai é a própria descentralização da sociedade na figura do homem, mas isso é uma outra discussão, o que podemos ver por alto é que a maioria dos presos e assassinados são homens e existe mais de um milhão de crianças sem pai, portanto, eis a pergunta: quem seria este ser fantástico?Um esperma (entre milhões)? O padrasto? Ninguém? - O que faz o pai? Ele paga as contas? Não. Ele estabelece regras? Não. Ele dá um aconchego emocional à família? Não.

Talvez o pai de hoje seja uma entidade virtual, aquele que chega de repente e se estabelece como uma fonte de informações sobre este mundo, que para alguns é Jesus ou o Padre Marcelo Rossi, para outros é o vereador da cidade. Até o jogador Ronaldinho pode ser visto como uma espécie de pai para milhares de torcedores. Considerando também que mulheres sempre supriram muito bem este lado, podemos dizer que apenas alguns conseguem ser pai não porque estamos numa sociedade libertária de mulheres evoluídas e independentes, mas porque esta figura ainda carece de utilidade neste nosso mundo contemporâneo.

Jul 26, 2008

Alguns conseguem...manter a proximidade

Toy vendo a janela - não muito longe de nós, humanos

Não sei se é impressão minha, mas vivemos uma época em que temos cada vez menos amigos, e aqueles a quem damos esta carinhosa alcunha, estão cada vez mais distantes. Há pouco tempo uma amiga me disse que não queria se aproximar de gente nova pois não tinha tempo para “doar” e que as pessoas cobram de você quando você oferece atenção. Fiquei me perguntando o quanto isso tem de “humanidade”. Ela está correta em dizer que só podemos prometer aquilo que temos condições de dar, entretanto, não estou certo o quanto posso subestimar a atenção que recebo de alguém. Não acredito que somos como um vale refeição, um ingresso para o cinema. Pessoas são mundos, já dizem todas as máximas filosóficas, e se nos afastamos de novas pessoas, fechamos portas,eliminamos possibilidades; Fazemos o nosso mundo, imperfeito, o cubículo apertado onde passaremos o resto da nossa breve vida.

De certo, temos muitas pendências formais atualmente: contas pra pagar, chefe pra satisfazer, namorados para agradar (ou vice-versa). Mas temo que seja por aí que comece a nossa miséria. Nem precisa dizer que trocar um café num fim de tarde com alguém interessante por colocar a roupa na máquina é no mínimo humilhante; É como se disséssemos aos nossos sentimentos: o último que sair, apague a luz.

Jul 13, 2008

Alguns conseguem...viajar

Pirâmide de Giza, Cairo.

Um dos dinheiros mais bem empregados da sua vida será em uma viagem. Poucos irão reconhecer isso. Burlar o prazer instantâneo de um celular, o conforto de um carro novo ou a segurança de um apartamento não é tarefa fácil. Não estou dizendo para abolirmos nossos bens duráveis e partirmos juntos numa grande viagem ao redor do planeta Terra; Mas que não pensar no nosso dia-a-dia mais banal quando planejamos o uso do dinheiro é algo que só os espíritos livres conseguem fazer. De certo há uma lógica nisso: quero construir, quero ser independente, quero que as pessoas vejam o quanto ganho, é comum ouvir isso.


Entretanto, o investimento em saúde espiritual é algo até hoje não mensurado pelos especialistas, mas se fosse, teríamos um susto. É notório perceber quem tem ou quem não tem uma experiência bacana de vida. É claro que você pode ser uma pessoa incrível sem nunca sair do seu habitat, mas não contando com exceções e personagens que só aparecem de tempos em tempos, ao abrir a boca é fácil distinguir o que é e o que não é interessante. Quem é “João Marcelo” ou quem é “Ragathan”. Você terá uma vida deslumbrante se pelo menos de vez em quando arrumar as malas e for até a esquina e pegar o primeiro ônibus, o avião ou trem. O meio não importa. Se pensarmos bem, Para quê nós vivemos? Para atender a quem? A ninguém. Vivemos para experimentar, para testar a nossa enciclopédia sensorial. Viajar é dar um impulso à isso. Ao novo, ao que está por vir, ao que só você conhece. O mundo se descortina de uma forma impensada. De repente, a vida pode ser uma viagem, cujo destino já sabemos qual é.

Alguns conseguem...viajar

Pirâmide de Giza, Cairo.

Um dos dinheiros mais bem empregados da sua vida será em uma viagem. Poucos irão reconhecer isso. Burlar o prazer instantâneo de um celular, o conforto de um carro novo ou a segurança de um apartamento não é tarefa fácil. Não estou dizendo para abolirmos nossos bens duráveis e partirmos juntos numa grande viagem ao redor do planeta Terra; Mas que não pensar no nosso dia-a-dia mais banal quando planejamos o uso do dinheiro é algo que só os espíritos livres conseguem fazer. De certo há uma lógica nisso: quero construir, quero ser independente, quero que as pessoas vejam o quanto ganho, é comum ouvir isso.


Entretanto, o investimento em saúde espiritual é algo até hoje não mensurado pelos especialistas, mas se fosse, teríamos um susto. É notório perceber quem tem ou quem não tem uma experiência bacana de vida. É claro que você pode ser uma pessoa incrível sem nunca sair do seu habitat, mas não contando com exceções e personagens que só aparecem de tempos em tempos, ao abrir a boca é fácil distinguir o que é e o que não é interessante. Quem é “João Marcelo” ou quem é “Ragathan”. Você terá uma vida deslumbrante se pelo menos de vez em quando arrumar as malas e for até a esquina e pegar o primeiro ônibus, o avião ou trem. O meio não importa. Se pensarmos bem, Para quê nós vivemos? Para atender a quem? A ninguém. Vivemos para experimentar, para testar a nossa enciclopédia sensorial. Viajar é dar um impulso à isso. Ao novo, ao que está por vir, ao que só você conhece. O mundo se descortina de uma forma impensada. De repente, a vida pode ser uma viagem, cujo destino já sabemos qual é.

Jul 5, 2008

Alguns conseguem...ser xenômanos

Jovens em Tóquio, sempre xenômanos

Xenomania é a devoção por tudo o que é estrangeiro, é supervalorizar o importado acima de qualquer equivalente nacional (produtos ou pessoas); é rejeitar a sua mais local referência, seria o contrário de “senso de lar.”Porque algumas pessoas são xenômanas? Por várias razões. A Economia é uma boa desculpa; inflação alta, desemprego retumbante, imagens miseráveis do País rodando a imprensa no mundo, sou brasileiro?.Passar na imigração em qualquer visitinha internacional? Ficar em fila separada? Imagina, não tem preço. Quem não quer ser beneficiário da burocracia anti-imigratória dos países ricos? O bizarro começa quando apenas esses países (desenvolvidos) são a alma-mater, o chamariz de filhos pródigos.Nunca vi ninguém se dizendo herdeiro africano e querendo passaporte angolano, apesar da África ser a segunda “origem” brasileira.

O certo é ser nacionalista? Não necessariamente. Ninguém precisa ser Policarpo Quaresma, o bonito em uma cultura é a sua afirmação, a sua identidade. Dá pra viver num mundo globalizado, lidando com conceitos e consumindo produtos estrangeiros sem ter que tocar fogo na bandeira nem querer ser aquilo que consome. Quando o olhar além mar é levado ao extremo, temos uma atitude chata arrogante. Primeiro porque nasceu no Brasil é Brasileiro, na Argentina, Argentino. Não dá pra mudar. Exceto aqueles que se mudam do país com 5 anos de idade e não voltam nunca mais. Qualquer coisa diferente disso, vira patético. Por mais que existam comunidades estrangeiras no Brasil, especialmente formadas por ex-imigrantes, é óbvio que um país grande como nosso tem condições indiscutíveis de absorver e transformar esse povo. Tive um amigo que ao tirar um passaporte italiano foi à Itália para turismo e questionado pelo dono da pousada em que ficou, de onde era, ele respondeu: “da Sicília” (região de onde vieram seus avós), a resposta do velho: “com essa cara de brasileiro?”.

Jun 29, 2008

Alguns conseguem...ter caráter

Joaquim Silvério dos Reis (1756-1819), o "Judas" brasileiro

A definição de caráter em qualquer dicionário é a mesma de personalidade, convicção, vontade, determinação natural. “Bertrand tem caráter”- Bertrand tem opinião, postura, certeza do que quer. Mas será que a realidade nos mostra isso?. Em todas as situações da vida lidamos com a questão do caráter, observamos infelizes que escorregam nele e somos cobrados para tê-lo. Especialmente nos meios corporativos, em que a ética é moeda de troca para promoção, plano de carreira, e benefícios, isso pode ser muito relativo. Hoje em dia, caráter é o positivo, é a qualidade de ser justo, de estar à altura de qualquer verificação aleatória de honestidade. Uma espécie de bafômetro para a santidade. Acontece que atualmente poderíamos arranjar um sinônimo para caráter: interesse. Fugindo do sentido religioso da coisa, temos dois lados para a mesma história, o do conceito e da moral. Seria Judas uma pessoa de caráter? Talvez não. Seria Pilatos, uma pessoa de caráter? Também não.

A fraqueza de Judas na traição ao seu mestre foi um gesto de incoerência, uma desobediência infantil por 30 pratas, algo que não lhe deixaria rico nem tampouco significava seu objetivo de vida, um interesse banal. Já o gesto do segundo, foi uma reação coerente para o povo e para o Império do qual fazia parte. Como funcionário romano, não era esperada nenhuma atitude diferente. Neste caso, por mais que Pilatos tivesse caráter, a sua obediência foi movida pelo interesse de se manter no cargo e não causar maiores transtornos para a ordem.

É preciso resgatar o sentido original desta palavra nos dias de hoje. Agir pelo interesse ególatra, ok, somos humanos. Agir com caráter, sempre, é necessário. Valorizar o verdadeiro caráter é cortar à navalha a moral; A mesma que garante ao humano a sua sobrevivência, lhe corta as asas da evolução. Sem crescer, o homem não se sustenta, acaba sendo levado pelas correntezas do momento, se torna um mero coadjuvante da sua própria história. Quem já não foi Judas ou Pilatos? Nem precisa dizer que apesar das motivações diferentes, eles próprios tiveram o mesmo destino, o suicídio.

Jun 21, 2008

Alguns conseguem...ter modéstia

Adão e Eva - Albrecht Dührer ((1471-1528) - Um casal modesto

Modéstia à parte. Quantas vezes já ouvimos isso? Milhares? Sempre?. Poucas vezes nos damos conta, de que esta frase se tornou praticamente inútil. A modéstia não precisa ficar à parte, ela simplesmente não existe mais no nosso tempo. Há milênios, Sócrates dizia maravilhas sem deixar escritos ou Praxísteles não assinava suas obras primas e até inventores revolucionários não cobravam royalties. Desde Jesus Cristo (Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Quer maior falta de modéstia?) o mundo vem implantando uma cultura em que o anônimo é o louco e o que existe, tem que aparecer (o orkut que o diga).

Ter modéstia é fazer nossas obras e atributos serem reconhecidos por si só, sem o nosso esforço. Não estou falando da modéstia religiosa ou étnica, que obriga mulheres a usarem burca no oriente e os homens usarem calça para controlarem seu ímpeto sexual no ocidente. Me refiro à cultura cotidiana, àquela obviamente percebida. Eis o Guiness Book! Melhores do século, primeiro lugar no vestibular, Top 10, use a expressão que quiser, a modéstia não existe, estamos na cultura da competição Descoberta? Não. Isso não é novidade. Mulheres menos modestas que homens? Talvez. Pobres mais modestos que ricos? Difícil (já inventaram o celular).

A modéstia vai muito além de cobrirmos a nossa nudez, muito além de dispensarmos o troco como cortesia, muito além de receber um elogio e enrubecer-se, além de deixar de dizer “Eu já sabia” quando seu time ganha. Nossa Senhora de Fátima disse aos pastores em 1917: “Certas modas serão introduzidas que ofender-se-ão meu Filho muito." Bom, ela percebeu que falta modéstia hoje em dia; É o que nunca mais teremos, graças ao nosso querido mundo capitalista e deliciosamente burguês.

Jun 14, 2008

Alguns conseguem...ver a rua

Pierre Verger, Les Dormeurs

O que é a rua hoje? conexão entre a nossa casa e onde queremos chegar. A rua nunca é o próprio destino. A rua não é o logradouro , não são as duas faixas para o trânsito e duas calçadas, a rua é o mundo, é tudo o que não está sob uma redoma social, é um ambiente inqualificável. A rua não é o nosso trabalho, a nossa escola, os conhecidos. A rua é o inseguro, o vazio, o você mesmo sem o que te ampara, é um espaço onde as leis podem ser suspensas e onde pode-se receber desde uma cantada até um tiro.

O lar sempre foi o nosso mais seguro templário, a base da nossa paz e sobrevivência. Considerando que todos somos pessoas já crescidas, alimentadas e que sabemos nos defender, poderíamos ter uma ligação mais lírica com a rua. Todos aí é eufemismo, na verdade, me dirijo a quem tem sensibilidade para isso. Olhar a rua pode ser um convite a perceber outras realidades, e isso não quer dizer abraçar um mendigo, dormir embaixo de árvores. Significa apenas observar. Observar as diversas variáveis às quais não estamos expostos, nos aproximarmos mais do frio que não nos permitimos sentir, da fome que nem imaginamos como seja, da busca pelo básico, do essencial – característica ausente nos tempos supérfluos atuais.

A rua nasce, como o homem, do solução, do espasmo. Há suor humano na argamassa do seu calçamento. Cada casa que se ergue é feita do esforço exaustivo de muitos seres, e haveis de ter visto pedreiros e canteiros, ao erguer as pedras para as frontarias, cnatarem, cobertos de suor, uma melopéia tão triste que pelo ar parece um arquejante mais socialista, a mais niveladora das obras humanas.

“João do Rio, A Alma Encantadora das Ruas”

Jun 7, 2008

Alguns conseguem...manter a distância

Julia Roberts e Jude Law em Closer (2004) [referência óbvia]

De todos os desafios que envolvem os relacionamentos, guardar uma certa distância do ser amado é um dos grandes feitos. É sempre necessário nos precaver das armadilhas dos tempos de abundância. A reciprocidade é doce demais, sem ela não chegamos na esquina, não terminamos de tomar um sorvete.

Uma colar de pérolas, um presente sem embrulho, mil metáforas não ilustrariam como é chegar ao nosso limite sentimental. Pior do que não amar ou não ser amado, só a indiferença generalizada, tornar convencional o que era pra despertar furor. Como um animal que é seguido pelos instintos, o ser humano precisa de uma isca, da sua ração. Paradoxalmente, diria também que estamos sempre atrás do que nos perturba, do que nos despreza. Seja como amante ou como amigo, viver próximo demais a uma pessoa é tocar uma gravura com os dedos nus, um belo dia teremos apenas um pedaço sujo de papel, nada mais.

May 31, 2008

Alguns conseguem...ter amigos

Joseph Goebbels (1897 – 1945) (à esq.) com seu amigo, Adolph Hitler (1889 – 1945)

Nós, seres humanos, somos e agimos de maneiras diferentes dentro de um universo particular. Qualquer coisa que saia desse conjunto de valores simbólicos, para nós terá alguma coisa errada. Assim, sabemos criticar desde aquele cara que é avarento até aquele outro mané que tem medo da namorada, óbvio. Entretanto, seja por sorte ou por seleção natural (não vamos entrar nesta discussão) escolhemos um ou vinte indivíduos que serão os nossos aliados ao longo de um tempo ou pela vida inteira. De forma mais ou menos intensa, esses seres terão valores certos para conquistar o nosso respeito, afinal, os amigos são aqueles que sempre estão aparentemente salvos de qualquer intriga e podem ser os conselheiros na tomada de decisões(por vezes, erradas). Seja para falar ou para ouvir, ter a quem confiar é afivelar um cinto de segurança, um conforto para situações arriscadas. Nietzsche dizia que o terreno da amizade é inseguro e pensando bem, ele pode estar certo. Os amigos são pessoas como outras quaisquer, podem ser perversos como podem ser dóceis com outrem. No entanto, pela amizade ser um fenômeno até hoje inexplicável, o bendito sempre será absolvido da nossa fogueira da inquisição interior. E é bom que seja assim, pois a vida sem eles seria o Sahara no verão ou a Antártida no inverno, seria olhar para uma campainha que nunca toca ou para um cachorro que nunca late. Sinceramente ,às vezes fico pensando que teria motivos para não gostar dos meus por alguns defeitos que têm, mas aí penso melhor e vejo que antes teria que dirigir o mesmo sentimento a mim mesmo.

May 25, 2008

Alguns conseguem...ser Jayne Mansfield

Vera Jayne Palmer, ou Jayne Mansfield, foi uma atriz americana dos anos 50 e 60. Todos os seus trabalhos: filmes, peças, discos e campanhas publicitárias, tinham uma coisa em comum, pertencerem ao time B de produções, ou seja, baixo orçamento aliado ao gosto duvidoso. Preferia Mamie Von Doren, porém sempre viveu o estigma da “Marilyn dos pobres”. Assim como a Monroe, era loira, foi Coelhinha da Playboy e escreveu seu nome na calçada da fama. Apesar disso, estava disposta a ultrapassar a aura clássica da primeira e para isso tinha um aliado, na verdade dois, seus próprios seios.

Mesmo falando cinco idiomas e sabendo tocar violoncelo e piano, sua carreira foi estranha ao seu conhecimento. Ao longo da vida pública, foi protagonista de vários episódios bizarros, como quando seus peitos simplesmente explodiam fora da roupa em eventos(fotos devidamente censuradas na época) ou quando provocava olhares aguçados de celebridades, como na foto com Sophia Loren. Outro episódio conhecido foi quando suas mamas foram desenhadas no céu por aviõezinhos de fumaça.
Tinha hábitos peculiares, como a obsessão pela cor rosa, com a qual decorou uma casa de 40 dormitórios que comprou na Sunset Boulevard, em Los Angeles, chamando a mais tarde de Pink Palace (tinha todos os móveis e roupas de cama rosa, além de uma piscina no formato de coração também desta cor. A casa foi demolida em 2004), no rol de extravagâncias, também poderíamos citar quando fez propaganda para uma seita satânica e quando Jimmy Hendrix, após um pedido, tocou guitarra em um dos seus discos.
Jayne morreu aos 34 anos em um terrível desastre de carro, em que segundo lendas, teria sido decaptada. Apesar das comparações depreciativas, tanto sua obra quanto sua vida são incomparáveis. Apesar das experiências um tanto over, seu ecletismo desengonçado (como cantar em alemão ou dublar músicas de Tchaikovsky) foi realmente corajoso. Mesmo não sabendo o que fazer com o seu corpo, Jayne atendeu perfeitamente a uma necessidade que Hollywood tem de vez em quando, de um personagem que roube a cena, que quebre a monotonia; alguém que leve a torta na cara ou que simplesmente, mostre os seios.

May 22, 2008

Alguns conseguem...parar


Feriado, mais dois dias na semana sem trabalhar, estudar etc. Fico pensando na quantidade de pessoas que me perguntaram o que eu ia fazer, quais eram os meus planos, se eu ia sair da cidade, pra onde eu ia. Bom, adoraria ir pra um lugar que me tirasse completamente da rotina, algum Éden que me levasse pra fora de tudo o que me comprime no dia-a-dia. No entanto, sair do caos ao paraíso, pelo menos pra mim, não é tão simples. Existe um período de trânsito de uma mentalidade pra outra. Mesmo em um feriado prolongado, precisaria de pelo menos uma semana entre “safras” para me dar ao luxo de me divertir. Mas o feriado pra mim é uma experiência em si, a de parar abruptamente, algo tão raro hoje em dia, exceto quando há alguma tragédia. Tem um poema de Carlos Drummond de Andrade que descreve a questão do tempo:

Cortar o tempo


Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias? a que se deu o nome de ano?

foi um indivíduo genial.

Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão
Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos
Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número
e
outra vontade de acreditar que daqui pra diante vai ser diferente...

May 18, 2008

Alguns conseguem...ajudar

Cartaz com foto de Madre Tereza (1910-1997) estimulando o voluntariado

A história do voluntariado se confunde com a própria história das profissões. A natureza de algumas ocupações foram dando forma ao conceito de esforço mútuo em direção à uma mesma causa, o Corpo de Bombeiros ou as Santas Casas de Misericórdia seriam bons exemplos.
Atualmente, graças ao grande número de pessoas dispostas a doar parte do seu tempo para alguma causa, muitas dessas vindas da classe média, o voluntariado se tornou uma espécie de profissão dentro do terceiro setor, com dinâmica digna de mercado formal.

Para os interessados, existem programas para todos os objetivos, sendo que os
animais e as crianças continuam as vedetes do público.
Em metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro, a vida do voluntário iniciante comum, ou seja, aquele que não faz parte de nenhuma organização religiosa ou humanitária, não é tão fácil quanto parece. Após decidir o que fazer, ele poderá enfrentará em algumas instituições - as maiores - um longo processo de seleção, incluindo dinâmicas de grupo, entrevistas e períodos de adaptação. Tudo isso é justificado pela necessidade de chegar a um casamento perfeito entre boa vontade e qualidade no serviço prestado. Entretanto, muitos nem chegam à fase de seleção devido aos cada vez mais cheios bancos de dados e listas de espera, o que representa um desafio para qualquer bom samaritano.

Crianças do Lesotho, África, beneficiadas pelo programa da UNV

A pérola dos programas de voluntariado é o UNV, das Nações Unidas. Com atuação em vários países, especialmente na África, América Central e Ásia, a United Nations Volunteers, divisão da ONU para voluntariado, recruta continuamente voluntários, que ficam divididos em vários módulos de atuação. Podem se inscrever profissionais liberais, executivos aposentados, jovens e qualquer um que possa dispor de seis meses a dois anos dando suporte às atividades das forças de paz ou a programas já estabelecidos. Vale ressaltar que a atividade não é remunerada, cabendo a ONU prover apenas ajuda de custo mensal e este valor varia de acordo com o custo de vida do país.

May 17, 2008

Alguns Conseguem


O titulo deste blog é baseado na obra do artista plástico Nazareno. Sua obra fala basicamente dos sentimentos humanos; da maneira que lidamos com nós mesmos e com os outros, seja ultrapassando barreiras físicas e ideológicas, seja criando novos obstáculos e preconceitos. É também disso que trata o blog. Através de imagens-síntese, pretendo analisar o cotidiano, tentando entender o poder que temos ou não temos sobre as coisas e descobrir uma luz que ilumine a escuridão da nossa condição humana.